Por ocasião do pasamento do Pe. José Comblin, dom Flávio Cappio (bispo da Igreja Católica, na Diocese de Barra-BA) e dom Sebastião Gameleira (bispo da Diocese Anglicana do Recife-PE), concederam uma entrevista a IHU On-line, a seu respeito e, nesta mesma ocasião o dom Cappio foi questionado sobre o Projeto de Transposição do Rio São Francisco. Nas suas palavras encontramos profundas verdades que revelam a realidade dramática deste projeto que infelizmente muita gente deixou de ver ou preferiu fazer-se de inoscente! Aqui apresentamos uma pequena parte desta entrevista, apenas aquela que se refere diretamente à questão da Transposição.
IHU On-Line – Padre Comblin vivia em Barra também. Vocês conversavam sobre a transposição do São Francisco? O que ele dizia sobre sua luta em relação à vida do rio?
Dom Cappio – Sempre conversávamos. Padre Comblin era um profundo defensor da vida, da vida do povo nordestino, da vida do povo ribeirinho, e ele sempre foi contrário ao projeto de transposição, porque ele via que este iria defender os interesses dos grandes grupos da oligarquia econômica, contrária aos interesses populares. Padre José Comblinsempre foi um defensor dos direitos do povo. Quando ele via que este projeto era contrário aos direitos do povo, Comblin se colocou contrário ao projeto de transposição de águas do rio São Francisco e de todos estes projetos faraônicos que agridem a natureza e agridem os direitos da população de ter os seus bens necessários para sua sobrevivência.Ele via nesse projeto uma agressão à natureza e ao povo que necessita de água. Padre Comblin não conseguia admitir que essa água fosse tirada do povo para servir aos grandes projetos agroindustriais. Ele sempre foi contrário a estes projetos e, por isso, veio à diocese da Barra por ver que aqui havia uma postura muito forte, clara e transparente a defesa dos direitos da população.
IHU On-Line – E, nesse momento, como estão as obras de transposição do São Francisco? Continuam em pé? Que problemas já vêm se apresentando?
Dom Cappio – Elas continuam, mas com muita demora, muita delonga, com muitos contratos sendo revistos. O Ministério da Integração Nacional agora já postergou todos os prazos, não se têm mais datas previstas para a inauguração e nós sempre dizíamos que essas previsões eram um efeito político eleitoreiro, mas o pessoal não acreditava. Agora todas as datas foram postergadas e muitas atividades do projeto de transposição que estavam sendo realizadas foram paradas.Os grandes canais que foram abertos diante de um Sol clemente, estão com as placas de concreto rachando; os técnicos já estão dizendo que as placas não vão aguentar e que todos os canais terão de ser refeitos. É uma tristeza. Aquilo que nós sempre dizíamos, que o projeto não chegaria ao fim, e eu ainda acredito nisso, está acontecendo. Na medida em que ele vai sendo construído vão aparecendo tantos problemas paralelos que os custos estão sendo tão aumentados, os prazos estão sendo cada vez maiores, por isso tenho certeza de que o projeto não terá condições de chegar ao fim. Portanto, confirma-se aquilo que sempre dissemos: que este projeto era eleitoreiro, ou seja, para garantir as eleições de 2010. O projeto já cumpriu a sua função de garantir os recursos necessários para as eleições presidenciais do ano passado, então agora se ele vai ser levado adiante ou não isso pouco importa para o governo.
IHU On-Line – Sua luta, as greves de fome que o senhor fez em protesto contra as obras de transposição, como o senhor vê agora, diante desse cenário das obras?
Dom Cappio – Eu vejo que foi graças a todas aquelas lutas, àquele grito que foi dado, que fez mostrar para o Brasil e para o mundo o absurdo deste projeto. Na medida em que este projeto avança, a população está percebendo que tudo aquilo que se dizia sobre o projeto é verdadeiro. Há uma total falta de respeito para com as comunidades por onde os canais passam, uma total falta de respeito para com os municípios e estados por onde os canais estão sendo abertos. Também a presença massiva do exército brasileiro que intimida as populações, as indenizações que não estão acontecendo... Na medida em que o projeto avança, está se mostrando para que ele veio, e toda aquela propaganda feita pelo governo –de que seria a redenção do Nordeste–, cada vez mais o povo percebe o quanto era enganosa. Tudo aquilo que dizíamos, tudo aquilo que apontamos na época em relação ao projeto, tudo isso está se concretizando. Pelo menos o Brasil e o mundo tiveram a oportunidade de saber a verdade a respeito do projeto. Infelizmente, ele foi iniciado e, com o tempo, vai mostrar o grande engano pela qual toda a sociedade brasileira passou com a viabilização do projeto que, tenho certeza, não chegará ao fim. Veja matéria na íntegra da entrevista em: http://www.adital.org.br/ - Comblin: pedagogo, profeta e santo. Entrevista com D. Sebastião Soares e D. Luiz Cappio!
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