22 de mar. de 2009

O MINISTÉRIO PRESBITERAL HOJE

Na tentativa de compreensão da vida e do ministério dos presbíteros devemos de inicio fazer duas observações fundamentais: primeiro devemos situar a vocação presbiteral no seio do povo de Deus e, depois, devemos situar o ministério presbiteral (a vocação do presbítero) dentro do seu contexto em que vive e atua, isto é, devemos abordar o ministério sacerdotal dentro de um contexto mais amplo: o modelo de sociedade no qual vivemos hoje.
O Vaticano II, na constituição dogmática, sobre a Igreja, Lumen Gentium, afirma uma diferença de essência entre o sacerdócio batismal – comum dos fiéis – e o sacerdócio ministerial, porém, garante a dignidade comum, pois, ambos participam do sacerdócio de Cristo: Cristo Senhor, constituído pontífice dentre os homens fez do novo povo ‘um reino de sacerdotes para Deus seu Pai’ (Ap. 1,6). (...). Há uma diferença de essência e não apenas de grau entre o sacerdócio comum dos fiéis e o sacerdócio ministerial ou hierárquico. Contudo, ambos participam a seu modo do mesmo sacerdócio de Cristo e mantêm , por isso, estreita relação entre si. O sacerdócio ministerial, em virtude do poder sagrado que o caracteriza, visa à formação e governo do povo sacerdotal, realiza o sacrifício eucarístico em nome de Cristo e o oferece, em nome do povo. Os fiéis por sua vez, em virtude de seu sacerdócio, tomam parte na oblação eucarística. Exercem contudo seu sacerdócio na recepção dos sacramentos, na oração e na ação de graças, no testemunho da vida santa, na abnegação e na prática da caridade (Lumen Gentium,10).
Não podemos, contudo, deixar de dizer que a visão do sacerdócio batismal ou comum dos fiéis expressa no pensamento do texto conciliar é por demais limitada, pois, não abre espaço na pratica para a atividade dos fiéis. A eles apenas cabe a obrigação de cumprir as obrigações eclesiais. Eles têm apenas uma função passiva no seio no povo de Deus: ‘tomar parte na oblação eucarística, receber os sacramentos’, ‘rezar’, elevar a Deus ‘ação de graças’, ‘testemunhar uma vida santa’ e ‘praticar abnegação e caridade’.
O texto não especifica a missão própria do leigo, ‘cristão fiel’ no seio do povo de Deus, na Igreja. O que diz dele são, em primeiro lugar, exigências que devem, antes de tudo, serem requeridas para os ministros ordenados, para o ‘sacerdócio ministerial’.
Porém, pelo sacramento do batismo todos fazem parte do único povo de Deus e, estão assim inseridos no mesmo e único povo de Deus. Este é o elemento comum e a igualdade fundamental. É o sacramento do batismo que constitui a todos como membros do povo de Deus, que é o povo sacerdotal, profético, e régio. Isto que dizer que os elementos cristológicos, que é a incorporação comum a Cristo por meio do batismo, e o elemento eclesial, que é a integração de todos os batizados no Povo de Deus, a Igreja, são os mesmos para todos os batizados na Igreja.
Em segundo lugar vem a diferenciação, de acordo com a peculiaridade da pertença de cada um na Igreja, de acordo com a vocação pessoal de cada batizado.
O segundo elemento – o ministério presbiteral no mundo de hoje – quer dizer que a evolução do mundo e da Igreja, formadores do contexto do ministério presbiteral, não pode ser esquecido. O mundo em que atuam os presbíteros, hoje, está mudando e mudando, assim como a Igreja.
O próprio Vaticano II, na constituição pastoral, sobre a Igreja no mundo de hoje, Gaudium et Spes, encontra-se a constatação de que a sociedade atual passa por mudanças rápidas e profundas: “O gênero humano encontra-se hoje em uma fase nova de sua história, na qual mudanças profundas e rápidas estendem-se progressivamente ao universo inteiro.(...). A perturbação atual dos espíritos e a mudança das condições de vida estão vinculadas a uma transformação mais ampla das coisas” (GS, 04-05).
A pós-modernidade e a cultura urbana trouxeram conseqüências para a religiosidade, como tão bem demonstra o resultado da pesquisa feita pelo CERIS em seis regiões metropolitanas brasileiras, em 1999. Os resultados apontam para uma religiosidade caracterizada por ser individualista e intersubjetiva; para a construção de um catolicismo que pode ser denominado de afro-brasileiro, por conjugar crenças, de per si, antagônicas; para uma religião vivida mais a partir das circunstancias ligadas diretamente à vida pessoal do que a vida social; para uma conduta moral dos católicos que aceita as orientações ético-religiosas apenas parcialmente .
Sem, portanto, esquecer de uma visão de Igreja, em muitas regiões, que retoma um modelo de Igreja do passado, nas suas formas tradicionalistas: na liturgia, nas vestes sacerdotais, nas pregações moralizantes, nas reafirmações tradicionais da doutrina, etc. Tudo isso expressa a crise da sociedade atual e, conseqüentemente, a crise do jeito de entender a Igreja e a sua missão e, mesmo a ‘crise da religião’.
Os imperativos que se impõem são muitos, face às necessidades permanentes e novas postas pela sociedade hodierna, de modo particular diante da cultura atual e da situação socioeconômica vigente no país. Face a isso, o presbítero deverá assumir a sua vocação e exercer o seu ministério pastoral, que, ao lado de sua identidade ministerial, que não muda, exige uma nova feição para poder exercer a sua missão adequadamente, de modo a poder oferecer respostas satisfatórias às interrogações dos homens e das mulheres de hoje, sacudidos por um forte progresso de secularização e, ainda mais, de indiferença religiosa, não obstante os inúmeros sintomas de despertar religioso existente hoje.
Se no passado o enfoque na teologia sobre o ministério presbiteral era na figura do presbítero como animador das forças vivas da comunidade, coordenador dos ministérios da comunidade e da unidade, no seio do Povo de Deus, como elo de comunhão e, na construção do Reino de Deus, enquanto coordena em função da unidade. Assim se afirmava que o presbítero, em razão da sua função de serviço à comunidade eclesial, devia reunir e organizar, ‘coordenar’ todos os carismas e ministérios existentes no seio do povo de Deus.
Atualmente, o enfoque tem sido em uma outra perspectiva. Podemos ainda apresentar como causa dessa mudança de mentalidade o influxo da própria mentalidade cultural vigente, hoje, pois é próprio da cultura hodierna a predominância e o subjetivismo, que influenciou em muito o clero brasileiro. Neste sentido temos o descolamento da teologia do ministério presbiteral mais centrada na figura mesmo do presbítero e, nas suas formas de realizações pessoais. Daí o apega as cosas materiais, a busca de bem-estar social, a luta muitas vezes competitiva de ganhar mais, fazendo do ministério uma profissão, em alguns casos, o luxo, a busca do bom e do melhor, às custas do povo de Deus.
Não obstante, no plano da reflexão teológica, tem enfatizado a figura do presbítero e a realização do seu ministério, baseando-se numa mentalidade do passado, numa compreensão do seu ministério como ‘homem do sagrado’, o padre é o homem da sacristia. Dentro desta concepção, perde-se, muitas vezes, a dimensão pastoral do seu ministério, reduzindo o seu ministério a uma prática sacramentalista. O que encontra-se em perfeita harmonia com a afirmação anterior, mentalidade hodierna, ‘cultura do materialismo’, uma vez que na atual prática sacramental da vida da Igreja, realizar sacramentos significa ainda fonte de dinheiro para o ministro (padre).
Este redimensionamento da visão do ministério presbiteral tem sido enfatizado nos últimos anos, sobretudo, quando o ministério dos presbíteros tem sido assinalado, fortemente, na sua ligação com os tratados doutrinais e, em particular, os sacramentos e a liturgia . É claro que esta dimensão tem sua grande importância, porém, pode ser também, prejudicial, por ser, por vezes reducionista, quanto à realização do rico ministério que é o ministério presbiteral. Está por vir a época da reflexão teológica da vida e do ministério dos presbíteros, numa teologia bem articulada, em que apareça de modo verdadeiro a dimensão cultual, litúrgica e sacramental, do ministério presbiteral e, sua função comunitária e sócio-transformadora. Reflexão esta em que culto verdadeiro e profecia façam parte de uma única e mesma realidade: a vida e o ministério dos presbíteros. Esta deverá ser, pois, o nosso propósito e a nossa tarefa.
O(A) CATEQUISTA: DISCÍPULO(A)-MISSIONÁRIO(A) NA COMUNIDADE ECLESIAL

Apresentar a pessoa do catequista na dimensão do discipulado e da missionariedade nos faz pensar na V Conferencia do Episcopado Latino-Americano e Caribenho, realizada em Aparecida do Norte, São Paulo, de 13 a 31 de maio de 2007. Nossa proposta de reflexão segue dois caminhos bem precisos, pois, assim se realiza a missão do catequista:
a)O ser Discípulo-Missionário do Catequista refere-se ao seu ser, enquanto pessoa humana e cristã;
A respeito da relação entre catequese e evangelização o Diretório Nacional de Catequese diz: “o fruto da evangelização e catequese é o fazer discípulo: acolher a Palavra, aceitar Deus na própria vida, como dom da fé”. Porém, da nossa parte existe algumas exigências. Estas exigências podem ser resumidas em duas palavras evangélicas: conversão e seguimento!
Diz, igualmente, o DNC: “A fé é como uma caminhada, conduzida pelo Espírito Santo, a partir de uma opção de vida e uma adesão pessoal a Deus, através de Jesus Cristo, e ao seu projeto para o mundo. (...). O seguimento de Jesus Cristo realiza-se, porém, na comunidade fraterna. O discipulado, que é o aprofundamento do seguimento, implica renúncia a tudo o que se opõe ao projeto de Deus e que diminui a pessoa” (DNC, 34).
Somos conscientes que o mundo de hoje exige do catequista uma profunda formação, pois, este passa por profundas e rápidas mudanças e, portanto, a atividade catequética necessita de gente capaz de dar novas respostas às perguntas pertinentes da humanidade, tudo isso, porém, sem perder de vista o horizonte do Reino de Deus, a comunhão eclesial e seu ser anunciador de uma mensagem de salvação, porém, não é sua palavra, mas a Palavra de Deus, transmitida de geração e m geração, seguindo as orientações da Igreja, as propostas de seus respectivos pastores, na transmissão fiel daquilo que os pastores receberam e transmitem aos seus fiéis, muitas vezes por meio da atividade catequética exercida pelos ministros leigos, seus colaboradores diretos na transmissão do ensinamento do Evangelho.
b) O ser discípulo missionário na Comunidade Eclesial refere-se à sua missão. Ao que diz respeito à missão do catequista, este possui uma profunda relação com a sua comunidade, exerce uma atividade comunitária, na comunidade, em nome dela e para ela, como membro vivo da Igreja, portanto, sua missão é uma missão eclesial. Aquilo que o Diretório Geral para a Catequese chama de eclesialidade da mensagem evangélica, dizendo: “A catequese não é outra coisa senão o processo de transmissão do Evangelho, tal como a comunidade cristã o recebeu, compreende, celebra, vive e comunica de diversos modos” (DGC, n. 105).
O Diretório Geral para a Catequese apresenta a atividade catequética como uma atividade de toda a igreja, dizendo: “A catequese é um serviço único, realizado conjuntamente pelos presbíteros, diáconos, religiosos e leigos, em comunhão com o bispo”, portanto, toda a comunidade cristã deve sentir-se responsável por este serviço” (DGC, 219).
A fé transmitida pelos catequistas é a mesma recebida pelos apóstolos do próprio Jesus Cristo; estes por sua vez transmitiram aos seus sucessores, os bispos e, deles e em comunhão com eles, todos os seus colaboradores, os presbíteros. Nesta seqüência, em cada diocese, o bispo é o primeiro catequista, o “catequista por excelência” (Catechesi Tradendae, 63). A ele compete entre outras atividades para com a catequese, a de “suscitar e alimentar uma verdadeira paixão pela catequese; uma paixão, porém, que se encarne numa organização adequada eficaz”; empenhar-se para que os “catequistas sejam perfeitamente preparados para sua missão, conheçam cabalmente a doutrina da Igreja e aprendam na teoria e na prática, as leis da psicologia e as disciplinas pedagógicas” (DGC, 223).
O texto da III Semana Latino-Americana de catequese, descreve o atual contexto histórico e a necessidade da formação dos nossos catequistas nas seguintes palavras: “o contexto histórico e sócio-cultural de nossos povos com os rostos da globalização, do secularismo, do sincretismo religioso e do relativismo entre outros, está incidindo fortemente na vivencia cristã. Por um lado, isto oferece a oportunidade de viver a catolicidade, de buscar uma maior profundidade nos princípios fundamentais e nas convicções, mas, por outro lado, influi em um enfraquecimento que se manifesta no relativismo moral, na perda de referências à comunidade eclesial concreta, no abandono da Igreja católica, na falta de crença e na perda de sentido e de compromisso”[1].
1. A URGÊNCIA DA FORMAÇÃO PARA O DISCIPULADO NA CATEQUESE
Não poderia ser diferente, num contexto diversificado desse, com suas sombras e luzes, a preocupação fundamental dos pastores da Igreja, quer sejam bispos e padres, senão a preocupação em formar homens e mulheres comprometidos com a causa do Reino de Deus. Portanto, para isto requer-se “uma formação catequética realizada no contexto eclesial, pois, o catequista é, antes de mais nada, membro da Igreja, testemunha da fé e enviado por ela para anunciar a mensagem evangelizadora”[2].
O Diretório Nacional de Catequese, nos orienta na direção dizendo que “o momento histórico em que vivemos, com seus valores e contravalores, desafios e mudanças, exige dos evangelizadores preparo, qualificação e atualização. Nesse contexto, a formação catequética de homens e mulheres ‘é prioridade absoluta’ (cf. DGC, 234)”. Esta formação deve partir das bases da fé, isto é, inicial e permanente, na qual tem um tempo para seu começo, mas que durará por toda a vida, considerando que o ser humano e o mundo avançam assustadoramente e, nós como igreja temos que nos dar conta destas mudanças, procurando sempre aprofundar melhor nossos conhecimentos para que possamos melhor servir, caso contrário, colocamos em risco nossa identidade e nossa missão de cristãos, pois, “qualquer atividade pastoral que não conte, para sua realização, com pessoas realmente formadas e preparadas coloca em risco a sua qualidade” (cf. DGC, 234)[3].
A III Semana Latino-Americana de Catequese, refletiu muito bem a preocupação e a necessidade da formação do catequista, pois, muitas vezes estávamos supondo que nosso povo tinha sido suficientemente evangelizado, quando na verdade na sua grande maioria não tem a mínima consciência e mentalidade cristã, dizendo: “este contexto nos desafia e exige uma ‘revisão profunda’ na maneira de educar na fé e, por isso mesmo, da formação do catequista. ‘É imperativo elaborar uma educação na fé que forje uma identidade cristã sólida, com uma consciência lúcida de ser discípulo missionário de Jesus Cristo na comunidade’”[4].
A formação dos catequistas precisa ser conduzida por este modelo catecumenal para que, uma vez convertidos e evangelizados, convertam-se eles mesmos em discípulos missionários, por isso, ela precisa ser um processo que inicie verdadeiramente as pessoas no mistério de Deus, por meio da experiência litúrgica e do aprofundamento da doutrina evangélica, somente assim, a catequese deixará de ser um mero ensino, transformando-se mais em mistagogia, experiência vivencial de Deus, que conduz à interiorização do mistério, valendo-se da linguagem dos sinal, dos símbolos, dos ritos e das celebrações[5].

[1]. CNBB, A Caminho de um novo paradigma para a catequese. III Semana Latino-Americana de catequese. 2008 (n. 68), p. 37.
[2]. Idem, (n. 69), p. 37.
[3]. DNC, 252. Os documentos recentes da Igreja têm manifestado grande preocupação para com a formação dos agentes de pastoral, catequistas, leigos comprometidos e, todo o povo de Deus. Cf. Documento de Aparecida, n. 276; Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja no Brasil, n. 88-99; Diretório Nacional de Catequese, n. 283, 291-292, 314-318; Texto-Base: Ano Catequético Nacional de 2009, n. 119.
[4]. CNBB, A Caminho de um novo paradigma para a catequese. II Semana Latino-Americano de catequese. 2008 (n. 70), p. 38.
[5]. Cf. DGC, 84-85; Cf. CNBB, A Caminho de um novo paradigma para a catequese. II Semana Latino-Americano de catequese. 2008 (n. 71-73), p. 38.